Durante o mês em que se celebra a Consciência Negra, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) organiza uma série de atividades para fomentar o antirracismo na instituição. A ideia do Novembro Negro é promover o debate sobre as relações étnico-raciais e que enaltecem a cultura afro-brasileira. No Campus Blumenau, serão realizadas duas exposições e um intervalo cultural temático.
As exposições têm como objetivo ampliar a visibilidade da produção cultural e artística das pessoas pretas da comunidade acadêmica da UFSC para suscitar a reflexão e debates acerca do tema como forma de combate ao racismo estrutural.
Confira abaixo a programação completa e participe:
Exposições de Artes Visuais de Schilo Mucoviç
Local: Biblioteca Setorial de Blumenau
Data: 18 de novembro a 6 de dezembro
Nascido em Luanda/Angola, atualmente reside em Blumenau e é estudante do curso de Engenharia de Controle e Automação da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Desde pequeno desenvolveu suas habilidades artísticas, em trabalhos realistas e abstratos nas mais diversas técnicas de desenho e pintura. Sua grande inspiração se dá pelas máscaras africanas que representam uma parte muito significativa de sua cultura. Em 2019 passou a atuar profissionalmente como artista plástico e em 2022 chega ao Brasil para estudar Matemática na Universidade Internacional da Lusofonia (UNILAB), em Redenção, no Ceará. Na Unilab uniu-se ao coletivo de estudantes africanos fazendo diversas exposições e intervenções artísticas. Em julho de 2023 mudou-se para Blumenau. Na UFSC participou como expositor e ministrante nos eventos em Comemoração ao Dia da África e Novembro Negro. Schilo transmite em sua arte a luta do seu povo, suas memórias e a beleza do dia a dia em Angola.
Exposições de Poesias de Arlindo Udé Lé
Local: Biblioteca Setorial de Blumenau
Data: 18 de novembro a 6 de dezembro
Guineense da Guiné-Bissau, teve seu primeiro contato com a escrita aos 18 anos, quando começou a expressar em versos as experiências de sua vida e de amigos próximos, abordando suas realidades e contextos. Com a chegada à Unilab, no Ceará, em 2020, se viu inspirado pela força das poesias declamadas em eventos culturais, o que o levou a retomar sua produção poética. Desde então, tem presença marcada em celebrações significativas, como o Novembro Negro de 2022 e 2023 e o Dia da África em 2023, na UFSC Blumenau. Como Cronista e poeta, também é um dos fundadores do projeto Guingola, que promove a arte, cultura e história africanas no Brasil, buscando combater estereótipos negativos sobre o continente africano, especialmente em Blumenau, Santa Catarina cidade onde reside atualmente e é também estudante da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC graduando do curso de Licenciatura em Matemática.
Intervalo Cultural Especial: Alusivo à Consciência Negra
Local: Auditório da UFSC Blumenau
Data: 19 de novembro das 19h45 às 20h30
O objetivo da atividade é celebrar a diversidade e promover a troca de experiências culturais. Entre os convidados estão Jair de Almeida, contramestre de Capoeira (Brasileiro); Nathan Guerra de Almeida (Brasileiro); o artista plástico Schilo Vicente Mucoco (Schilomukoviç), que é graduando do curso de Engenharia de Controle e Automação. Haverá apresentação da banda Quarteto Fantástico e uma palestra com Luiz Herculano. A programação inclui, ainda, declamação de poesia com Arlindo Udé Lé, natural da Guiné Bissau e graduando da Licenciatura em Matemática.
Daiana Martini/Serviço de Comunicação UFSC Blumenau
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) organiza, ao longo do mês de novembro, uma série de atividades para fomentar o antirracismo na instituição. Durante o mês em que se celebra a consciência negra, a UFSC busca promover visibilidade às pesquisas, atividades junto à comunidade e eventos culturais que abordem os temas das relações étnico-raciais.
Segundo Joana Célia dos Passos, vice-reitora da Universidade, a Administração Central tem marcado de diversas formas, durante todo o ano, a importância de tratar as questões raciais no cotidiano da UFSC. “Nesse sentido, o Novembro Negro é mais um momento em que podemos pautar que o Racismo não será tolerado na UFSC, em nenhuma circunstância e também um espaço para a gestão prestar contas sobre o que tem sido feito para isso. É um Novembro Negro construído com a participação de coletivos, grupos de pesquisa, cursos e também de órgãos da gestão. Essa experiência de construção, a quantidade de ações e a linda programação mostra que as pessoas estão querendo muito que essa discussão seja de fato parte integrante da UFSC”, declara Joana.
Para a pró-reitora de Ações Afirmativas e Equidade (Proafe) da UFSC, Leslie Sedrez Chaves, é também uma oportunidade para a instituição mostrar o quanto se avançou no combate ao racismo institucional. “Em novembro completamos o primeiro ano da aprovação da Política de Enfrentamento ao Racismo Institucional, e desde então a UFSC tem se mobilizado para fazer o debate sobre o tema e implementar a Política. Este Novembro Negro será um momento de dialogar com a comunidade universitária sobre os avanços nessa implementação e apresentar o diagnóstico do racismo institucional na UFSC,” salienta a gestora.
Confira abaixo a programação do Campus Blumenau:
16 de novembro
Cine Debate: O Tropeiro e o Demônio Branco
Exibição do filme: 14h30 no Auditório
Live com a diretora Jana de Liz: 17h30 no Instagram @cultura.ufscbnu
20 de novembro
Cardápio especial no Restaurante Universitário de celebração à culinária africana e afro-brasileira
21 de novembro
Roda de conversa e oficina literária, com o professor José Endoença Martins
14h no Auditório
23 de novembro
Exposição de arte, roda de conversa e oficina Arte Africana, com o estudante e artista plástico SchilomukOviç
Exposição: Biblioteca
Roda de conversa e oficina: 14h30 no Auditório
Durante o último mês, o Campus Blumenau realizou diversas atividades que integraram a programação do Novembro Negro da UFSC, que teve como objetivo promover uma educação antirracista e potencializar relações étnico-raciais baseadas no reconhecimento e no respeito das diferenças entre as pessoas. O evento contou com a colaboração de estudantes e servidores, bem como de artistas do Coletivo Colmeia.
A primeira atividade, realizada no dia 23 de novembro, foi a exibição do filme Medida Provisória, seguida de um debate entre os participantes, mediado pelos convidados Luiz Herculano (brasileiro, professor do IFSC e doutor em Língua Portuguesa) e Juvinal Domingos da Costa (bissau-guineense, mestrando em História pela Udesc), que pesquisa a resistência ao colonialismo português no Arquipélago dos Bijagós na Guiné Bissau.
No dia 25, foi realizado um Intervalo Cultural temático, em celebração a cultura afro-brasileira, com performances de música, dança e poesia de matriz africana interpretados por estudantes do campus. Já no dia 29, foi realizada uma live com a professora Francis Tourinho, com o tema “Novembro Negro e a sociedade que não olha além do que os olhos podem ver”. A live está disponível na íntegra no Instagram da UFSC Blumenau (@ufscbnu).
Fechando a programação, na última quarta-feira, 30 de novembro, foi realizado um sarau de lançamento do livro Direito, comunicação e cidadania: intersecções étnico-raciais, de autores vinculados a diversas instituições de ensino superior (UFSC, IFSC, FURB, UNILAB E Unisociesc), que desenvolvem coletivamente ações antirracistas. O sarau contou com performances do grupo Maracatu Capivara, do Movimento de Capoeira Canto com Axé e artistas visuais, configurando-se como uma Polinização do Coletivo Colmeia (@coletivocolmeia), formado por artistas blumenauenses.
Além dos eventos, o Novembro Negro na UFSC Blumenau também contou com duas exposições fotográficas. A aluna Victória Gattás aprovou as atividades realizadas pelo campus para promover o debate sobre o combate ao racismo. “O uso da arte como aliada no enriquecimento do conceito de racismo no imaginário daqueles que fizeram parte das ações do Novembro Negro foi um valiosíssimo acerto na escolha das estratégias adotadas para abordar o tema”, disse.
Política de Enfrentamento ao Racismo Institucional
Em meio às atividades do Novembro Negro, o Conselho Universitário aprovou, em reunião realizada na última terça-feira, 29 de novembro, a Política de Enfrentamento ao Racismo Institucional – um conjunto de normas, divididas em sete capítulos, que orienta desde a identificação de atos discriminatórios até a forma de denúncias, encaminhamentos e acolhimento das vítimas. Para mais informações, clique aqui.
UFSC Antirracista e Antinazista
Ainda como forma de reforçar seu posicionamento contra preconceitos e violências, a Universidade lançou em novembro a campanha UFSC Antirracista e Antinazista, que estimula toda a comunidade universitária a combater o racismo e o nazismo na instituição, bem como a denunciar casos que se tenha conhecimento. Para mais informações sobre a campanha, clique aqui.
Confira abaixo mais fotos do Novembro Negro na UFSC Blumenau:
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) segue promovendo ampla visibilidade às ações de combate ao racismo e ao nazismo na instituição. Ao passo que promove o debate acadêmico, a UFSC se posiciona claramente antirracista e antinazista e estimula a participação de toda a comunidade universitária.
Uma manifestação do Conselho Universitário (CUn) sobre o enfrentamento ao nazismo será debatida na próxima terça-feira, 22 de novembro, em uma sessão extraordinária aberta ao público, às 14h, no Auditório da Reitoria. A sessão terá transmissão ao vivo pelo canal do CUn no YouTube.
“Denunciem, aprendam a denunciar. Não pode ser perigoso para o denunciante. Tem que ter perigo para quem faz as agressões”, disse a vice-reitora da UFSC, Joana Célia dos Passos. “Não é possível mais que a gente busque terceirizar as violências da Universidade. O combate a elas é responsabilidade de cada um de nós. É importante que a gente tenha protocolos de denúncia e isso está sendo consolidado. Nós queremos que todos e todas aqui, além de se posicionar contra as violências, denunciem”.
“UFSC Antirracista e Antinazista”
Dentre as ações realizadas nas últimas semanas, a UFSC lança também uma campanha institucional que posiciona a Universidade como um espaço antirracista e antinazista. Criada pela Coordenadoria de Design e Programação Visual da Agência de Comunicação (CDPV/Agecom), a campanha se utiliza de referências amplamente conhecidas, como a imagem dos punhos cerrados, representação de lutas dos movimentos sociais e de direitos humanos. O objetivo é divulgar os canais institucionais para denúncias e dar visibilidade ao fluxo de averiguação e decisão.
A Ouvidoria da UFSC é o órgão responsável por receber as denúncias de qualquer espécie. Os processos de apuração, julgamento e punição dos responsáveis seguem fluxos definidos na legislação interna da universidade, bem como o que é definido nas leis federais.
Segundo a secretária da Secretaria de Aperfeiçoamento Institucional da UFSC, Luana Heinen, esses caminhos não são amplamente conhecidos pela comunidade universitária. “Percebemos que falta também conhecimento sobre quais itens precisam constar em uma denúncia e sobre a importância da produção de provas, bem como sobre os direitos ao contraditório e ampla defesa, que devem ser assegurados a todos os acusados. A consolidação e divulgação dessas informações tem o papel fundamental de informar, para que as vítimas saibam os ritos a serem seguidos, sentindo-se mais seguras para denunciar. A comunidade universitária, por sua vez, poderá exercer o controle social sobre as instâncias de apuração e conhecer melhor as exigências legais para a responsabilização em cada caso”, salienta Luana.
Novembro Negro
A UFSC debateu as questões envolvendo a ascensão da extrema-direita e eventos recentes de racismo e neonazismo em um painel realizado na última quinta-feira, 17 de novembro. Além disso, a Administração Central promoveu, no dia 1º de novembro, uma audiência pública para discutir a proposta de Resolução Normativa para uma Política de Enfrentamento ao Racismo Institucional.
Será realizada, no dia 1º de novembro, uma audiência pública no Auditório da Reitoria e via Web Conferência para discutir a Proposta de Minuta de Resolução que institui a Política de Enfrentamento ao Racismo Institucional na UFSC. A audiência começa às 17h30, com uma apresentação da construção histórica da Política e o registro das contribuições da plenária em ata, de modo a compor o processo a ser enviado para análise do Conselho Universitário (CUn).
A Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Equidade (Proafe) é a unidade gestora da comissão que trabalha na minuta de Resolução. Desde 2018 ela vem sendo elaborada, e a comissão vigente foi nomeada em janeiro deste ano. A pró-reitora da Proafe, Leslie Chaves acredita que a discussão da Política durante o Novembro Negro é bastante simbólica. “É fundamental a redação e elaboração dessa política de combate ao racismo. Essa minuta que será apresentada e debatida teve a participação de diversos setores da sociedade, além da comunidade acadêmica, de movimentos sociais, em um trabalho conjunto para pensar todos os mecanismos de combate ao racismo, violências decorrentes de questões raciais”, ressalta.
“Todos devem tomar conhecimento, e devem contribuir. Assim, todos assumem a luta contra o racismo, não só as pessoas negras. O racismo é um problema de toda a sociedade, do conjunto da sociedade. Todos temos que nos comprometer com o combate a essas violências. Esse debate acontecerá ao longo do mês de novembro, junto com reflexões que estão sendo organizadas em diversos espaços da universidade, é fundamental para além de celebrações, estamos marcando uma posição política de combate e não permitir que [o racismo] ocorra no ambiente universitário”, pontua.
Para Leslie, é importante que a população negra esteja visível, com suas representações demarcadas no espaço universitário. “A discussão da Política acontecer neste momento, tanto pela comunidade na Audiência Pública, como pelo Conselho Universitário, além de ser um ato político é também um ato pedagógico. Um dos nossos papeis na universidade é mostrar aos poucos a importância do respeito à diversidade e do combate ao racismo. Contamos com a participação dos estudantes, servidores docentes e técnicos, e da sociedade, dos movimentos sociais. Queremos todos integrados nessa discussão. O combate ao racismo é papel de toda a sociedade e um compromisso desta gestão”, disse a pró-reitora.
Segundo a diretora de Ações Afirmativas e Equidade da UFSC, Marilise Sayão, a Política abordará questões referentes às diferentes formas pelas quais o racismo deverá ser enfrentado institucionalmente, com a previsão de monitoramento e avaliação permanente dessas ações, como devem ser feitos os registros das de denúncias de racismo, a caracterização do que se configura como ato e prática de racismo, bem como o acolhimento das vítimas, afirma.
Segundo Marilise, um dos objetivos é fazer um diagnóstico do racismo institucional na UFSC, considerando os diferentes níveis e setores, e agregar as ações de enfrentamento ao racismo institucional. A diretora da Proafe informa que a proposta de resolução normativa passou por adequações solicitadas pela Secretaria de Apoio Institucional (SEAI) da UFSC, inclusive sobre como serão disciplinadas as situações de racismo, de forma preventiva, inclusive.
“Questões referentes às denúncias, bem como do acolhimento às vítimas também precisaram figurar na proposta. Igualmente, as atribuições dos setores e o papel no acompanhamento e apuração das denúncias precisam ser observados, para que estes atuem dentro dos limites permitidos pela legislação. Esses limites também incluem princípios garantidores do devido processo legal e da imparcialidade”, ressalta a gestora.
A proposta regulamenta o enfrentamento ao racismo em todas as suas formas, e inclui estudantes, servidores e terceirizados. “Pensamos em uma proposta que considere uma central de acolhimento às vítimas; a participação estudantil e dos coletivos na construção da proposta; ações de educação e prevenção e a qualificação das instâncias de apuração de denúncias da universidade, com um setor permanente de acompanhamento e controle social da política, após aprovada”, relata.
Uma UFSC verdadeiramente antirracista
As desigualdades no ingresso de pessoas pretas e pardas na UFSC cresceu significativamente nos últimos 15 anos desde a implantação das políticas de ações afirmativas. “Ainda que seja o início de um processo, a presença destes alunos nos cursos de graduação e pós-graduação já estimulam mudanças e discussões que ainda não são familiares para muitos setores da Universidade. Hoje temos um percurso na instituição muito diferente do período anterior às políticas de ações afirmativas, e os conflitos daí derivados, muitos destes manifestados por ações racistas, evidenciam ainda mais o quanto o racismo se estruturou no nosso país e como isto se reflete no meio acadêmico”, reflete a professora Marilise.
“Passamos da senzala para a casa, da casa para a escola, da escola para a sociedade, da sociedade para a universidade. Esses estigmas não se perderam e se manifestam na forma de discriminação e racismo dentro da instituição e isso não pode mais ser tolerado, minimizado, ao contrário, precisa ser combatido. Não se pode mais negar uma estrutura montada desde a época da colonização que é excludente e que precisa ser enfrentada. A universidade deve assumir a existência dessa estrutura, e passar a revê-la, repensá-la”, salienta.
A gestora acredita que para que a UFSC seja efetivamente antirracista, a aprovação desta Resolução é um passo importante. “É nosso dever não só abordar de forma analítica os contextos sociais, históricos e econômicos do racismo, mas enfrentá-los de forma política. Ademais, o reconhecimento do racismo institucional é fundamental para a construção de um pensamento crítico que desconstrua o mito da democracia racial e descortine o pacto narcísico da branquitude. Por isso, a aprovação dessa política será muito importante, porque efetivamente será possível combatermos práticas discriminatórias e racistas no âmbito institucional; criarmos programas de acolhida e acompanhamento psicológico; pensar em currículos que ampliem o direito antidiscriminatório e a abordagem de temáticas étnico-raciais; vislumbrar uma compliance antirracista, que seja responsável pela fiscalização e garantia de políticas e posicionamentos internos efetivos para a prevenção e combate dos racismos; e, por fim, a formação de servidores que combatam posturas racistas. Uma política como esta, se for aprovada, mostrará à comunidade acadêmica, e à sociedade, que a UFSC não só não tolera, como enfrenta e combate o racismo”, conclui.
O ano de 2020 tem sido de tensões e preocupações. A busca pelo controle da pandemia de Covid-19 tem nos obrigado a estar fisicamente isolados, afastados uns dos outros. Mesmo assim, há espaços sendo abertos para as mobilizações. Um dos principais movimentos observados neste momento tem sido a luta antirracista.
O movimento ganhou força nos Estados Unidos, em maio, quando George Floyd, um homem negro de 46 anos foi sufocado até a morte em uma ação policial. Protestos se espalharam mundo afora e deram força ao ativismo pelo direito de não morrer em abordagens policiais. Em meio à pandemia, as pessoas saíram às ruas para dizer que as vidas negras importam, que as pessoas negras têm direito de respirar, de viver dignamente.
Neste 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, não haverá mesas-redondas, debates e palestras nos auditórios da UFSC, como normalmente ocorreria. No entanto, haverá lives, pela Internet, e educação sobre as lutas do povo preto.
Não basta não ser racista
O que afinal significa ser antirracista? O termo não é novo. A ativista e filósofa negra Angela Davis, durante um discurso em 1979, nos Estados Unidos, afirmou: “Numa sociedade racista, não adianta não ser racista, nós devemos ser antirracistas”.
Ser antirracista é ir além de denunciar o crime de racismo ou a injúria racial, é muito mais que simplesmente não ser racista. É observar com senso crítico; ser agente de mudança. E a prática antirracista leva à criação de medidas de enfrentamento estrutural e institucional ao racismo.
A doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Jaqueline Conceição da Silva, salienta que a luta antirracista é pró-ativa, e é a resposta para mudar estruturas que “mantém pessoas brancas em locais de poder e com privilégios”, pois, ela explica, “é por meio de ações antirracistas que ocorre a mudança de relações sociais”.
Jaqueline Conceição da Silva (Arquivo Pessoal)
A mudança, ressalta a pesquisadora, “passa pela contratação de líderes negros em grandes empresas, e também pela formação, a alfabetização racial de pessoas brancas e pessoas negras para que elas entendam o que é o racismo e os seus efeitos”.
Francis Vieira Tourinho, secretária de Ações Afirmativas e Diversidades na UFSC, ingressou como aluna na UFSC em 1987 em uma época que, segundo ela mesma recorda, quase não havia negros na instituição. A professora do Departamento de Enfermagem hoje atua como gestora e trabalha diretamente nas ações de equidade e na implementação das políticas de ações afirmativas.
Francis Tourinho (Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSC)
“A adoção de ações afirmativas está aos poucos mudando a realidade das universidades e dos negros, porém, apenas a Graduação não é suficiente para reparar ou compensar efetivamente as desigualdades sociais resultantes de um legado histórico de exclusão social, desigualdade estrutural, racismo estrutural e graves atitudes discriminatórias que se perpetuam no presente”, pontua a secretária.
Uma tentativa de reparar desigualdades históricas, a adoção das políticas de ações afirmativas atualmente acontece na Graduação e em concursos públicos na UFSC e, em 2020, também na pós-graduação. No último mês de outubro, a Câmara de Pós-Graduação aprovou e o Conselho Universitário confirmou, em decisão unânime, que os programas de pós-graduação da UFSC deverão destinar, anualmente, 20% das vagas para candidatos pretos, pardos e indígenas e 8% para pessoas com deficiência, e outras categorias de vulnerabilidade social.
“As Universidades são ocupadas por uma maioria de pessoas brancas, incluindo o corpo docente, discente e gestor. Assim observamos que a universidade é um reflexo da sociedade, e esta é discriminatória. Isso torna o acesso dos negros em universidades, pós-graduação e empresas ainda mais difícil. Ainda se ouvem argumentos e discussões contra as políticas de ações afirmativas”, lembra Francis.
Ainda estamos distantes de uma efetiva implementação das políticas. Além de garantir as vagas, a universidade pública deve preocupar-se com a permanência, o apoio e acompanhamento dos alunos e combater as fraudes.
“Eu tenho uma trajetória longa de formação racial, e ainda assim sofro psicologicamente e politicamente com os desdobramentos do racismo no fluxo das relações dentro das instituições. Imagina uma menina, um menino, de 17, 18 anos, que sai de sua cidade de origem e vem morar num estado que é o mais racista do Brasil e em uma universidade que muitas vezes silencia as próprias tensões raciais. Esse é o nosso desafio, a efetividade com qualidade das políticas de ações afirmativas dentro das universidades”, enfatiza a doutoranda Jaqueline.
Já parou para pensar quantos professores negros você teve em sua trajetória escolar? Se você é branco, quantos negros você admira? Quantos autores negros você já leu? E se você é negro, você se sente representado nas mídias culturais? E em sala de aula? E na pesquisa acadêmica, no currículo de seu curso superior, como estão representadas as pessoas negras?
Jaqueline já pensou e estudou muito sobre o assunto e concluiu que, desde criança, nunca teve um professor ou professora negro, como ela. Mesmo assim, ela tornou-se pedagoga, mestra e agora será doutora pela UFSC. A paulistana, nascida na periferia da maior metrópole das Américas, afirma: “sou a primeira e a única mulher da minha família a completar o ensino superior, a fazer mestrado, doutorado”. Jaqueline é de uma geração anterior às políticas de ações afirmativas na Graduação, mas ingressou no doutorado já como cotista. “No programa em que eu fiz mestrado – na PUC/SP – não havia, e até hoje não tem ações afirmativas”.
Jaqueline conta que sofreu muitas situações de violência e racismo estrutural durante a sua formação. Sua resposta foi seguir estudando, e criar o Coletivo Di Jeje, um Instituto de Pesquisa e Formação sobre Questão Étnico Racial e de Gênero, com plataformas de ensino e aprendizagem na modalidade virtual.
“Desse processo, das violências que eu sofri, fica para mim o Coletivo, um espaço de formação, pesquisa, produção de conteúdo sobre racismo, com uma perspectiva a partir do feminismo negro. Se origina a partir do que observei como pedagoga e do meu caminhar, do que deve ser uma prática educativa que emancipe o sujeito”, explica a pesquisadora.
A presença de professores negros, doutores, pesquisadores que se autodeclaram pretos ou pardos ainda é tímida na UFSC. Segundo dados do sistema Administrativo de Recursos Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, há 19 professores que se autodeclaram pretos, e 43 pardos. Já os técnicos-administrativos em Educação autodeclarados pretos são 43 e pardos, 115. Entre os estudantes, se autodeclaram pretos 1.555, e pardos são 3.464.
A preocupação com a representatividade negra não está apenas em ver pessoas negras em posições de destaque. Segundo Jaqueline, ainda há muito o que evoluir para que as universidades deixem de ser ambientes historicamente de predominância branca e masculina. “As universidades precisam se engajar em projetos políticos-pedagógicos que garantam a presença da diversidade, não só no corpo de funcionários, mas também no currículo”, salienta.
Apesar de ser uma área que debate as questões étnico-raciais, Jaqueline aponta que a própria Antropologia precisa aprofundar a representatividade dos povos que estuda. “É importante incluir, além dos temas, autores negros e indígenas. Mesmo em campos como a Antropologia, que estuda a negritude e etnologia indígena, quase não se lê esses autores. O currículo precisa passar pela produção intelectual de sujeitos desses grupos que estão sendo estudados”, ressalta.
A academia debate o racismo
Durante o período de pandemia, as mesas-redondas e seminários que antes atraíam a comunidade para os auditórios, hoje acontecem pelas redes sociais, e continuam disponíveis para quem quiser assistir depois. Sobram exemplos de lives promovidas por núcleos de estudos e pesquisas da UFSC, inclusive com os temas de representatividade negra, racismo e luta antirracista.
Eventos para marcar o Dia da Consciência Negra estão programados para acontecerem em meio virtual nesta e na próxima semana. O Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH) e o Centro de Ciências da Educação (CED) apoiam o Novembro Negro com lives nos dias 19 e 20 de novembro. Os eventos foram organizados por docentes e estudantes dos Departamentos de Psicologia, História, Geociências, Estudos Especializados em Educação e de Ciência da Informação, pelo Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Diferença, Arte e Educação (Alteritas), Núcleo de Estudos e Pesquisa em Ensino de Geografia (NEPEGeo), Laboratório de História Pública (LAPIS), Centro Livre de Geografia (CaliGEO) e pelo Colégio de Aplicação. Confira a programação e faça sua inscrição para ter direito ao certificado.
O Cine DDHH, um projeto do Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades (NIGS), convida para debate no dia 27 de novembro, às 17 h, sobre os curtas “O dia de Jerusa” e “Kbela”, em alusão ao Dia Nacional da Consciência Negra. Os curtas estão disponíveis no YouTube e recomenda-se que sejam assistidos antes do debate. A discussão ocorre em sala privada, via Jitsi Meet. Para receber o link de acesso, é preciso inscrever-se pelo e-mail .
Em outubro, a UFSC promoveu a Sepex em Casa, com uma série de eventos on-line ao vivo, debatendo a ciência. A palestra da professora Karine de Souza Silva (CSE/UFSC) e da doutoranda Daniela Núñez Longhini, intitulada “O antirracismo e o anticolonialismo na ciência”, teve como objetivo abordar a necessidade de que a ciência e a academia ampliem esforços para democratizar o conhecimento, incorporando outros saberes e outras lógicas à luz de perspectivas antirracistas e anticoloniais, colaborando para a desconstrução de práticas excludentes, racistas e colonialistas nas mais diversas áreas dos saberes e nas suas mais variadas dimensões. O conteúdo está disponível no Canal da UFSC no YouTube.
Em setembro, a professora Ilka Boaventura Leite (CFH/UFSC) e a representante do Movimento Negro Unificado (MNU/SC) Vanda de Oliveira Gomes debateram a invisibilidade do negro no sul do Brasil. Em julho, o Observatório Astronômico da UFSC perguntou para três astrofísicos brasileiros: “Como é ser cientista negra (ou negro) na Astrofísica?”. A live reuniu Alan Alves Brito, do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Denise Rocha Gonçalves, do Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Marcelle Soares Santos, da Universidade de Michigan, nos EUA. O conteúdo segue disponível no canal do Observatório no Youtube.